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A UMBANDA E A MONTANHA – por Alexandre Souteiro

A Mãe Lucília pediu para a corrente textos sobre a Umbanda. Apesar de não ser filho da casa, resolvi escrever um, que conta minha ligação com o TPM.

A umbanda e a montanha

Muitos já ouviram – e usaram – a frase “A montanha foi até Maomé”, como forma de expressar um caminho de duas mãos que, quando se acertam, geram um resultado inesperado.
Meu nome é Alexandre Souteiro, tenho 47 anos, sou filho de santo de um terreiro do Rio de Janeiro, cujo chefe é o Caboclo Sete Flechas.
Um pai, um amigo, um espírito de luz que está ao meu lado desde sempre. E, na umbanda, digo que fui batizado no terreiro antes de ir para a Igreja, além de ter pedido para o meu avô, aos 2 anos, aquele “homem do cavalinho”.
Antes de ser filho desta casa, fui atabaqueiro, cambone, acendedor do defumador e outras tantas funções na casa do Seu Ferro, que é de onde que eu conheço o Pai Fernando. Alguém que sempre terá o meu respeito e carinho. De lá me desliguei em 1995, e somente em 2002, no Rio de Janeiro, encontrei minha atual casa.
Por ser de uma casa do Rio, eu me reservo o direito – e o dever, fundamentalmente – de não correr gira (uma alcunha para quem visita todos os terreiros imaginários da face da terra).
Por respeito à minha casa, às regras da casa, e também por saber que existem muitas casas sérias, mas muitas que denigrem a Umbanda.
Mas, em 2013, algo aconteceu. Eu senti em meu lar que uma pessoa estava obsediada. À minha mente veio a primeira idéia: vamos pro Rio resolver isso. Mas era setembro, todos ocupados ao extremo com o trabalho, e uma viagem, por questões financeiras também, seria impossível àquela época.
Então conversei com minha Mãe de Santo, e ela me deu a orientação – e a licença – de procurar uma casa segura para resolver essa questão. Não é algo que se resolva à distância, por telefone.
E assim eu procurei por uma casa do Caboclo Sete Flechas. E achei. Por questões de respeito, não descreverei a casa. Mas sei que fui até lá me consultar. Eu e a pessoa.
Quando chegamos, a chefe da casa disse que ia chamar o Caboclo. Só que não vi cambone, ajudante, nada. Éramos eu, minha parente e a chefe. Ela parou na frente do Congá, deu 3 socos no peito, sentou na minha frente e começou a me consultar. Me passou uma lista enorme, e eu só queria que ela fizesse uma puxada (uma desobsessão), ou que riscasse um ponto.
Algo que qualquer terreiro sério resolveria da forma correta. Mas ela continuou escrevendo a lista. Havia pelo menos 21 pacotes de vela, de todas as cores. E me consultando. Não à minha acompanhante, que era a obsediada.
Naquele momento, resolvi mostrar que ela não estava lidando com um leigo, e disse: “Meu pai, como o senhor sabe, o senhor fechou meu corpo. Eu não pego essas coisas, quem está com problemas é ela”. Ali, a consulta acabou. Para mim, para quem me acompanhava.
Confesso que saí deste terreiro desanimado, triste. Pelo desrespeito com um espírito de uma luz infinita. Pelo desrespeito à umbanda, que tanto amo.
Às 6 da tarde, desta mesma segunda-feira, me liga o Paulo Torres, amigo dos tempos do terreiro do Seu Ferro, amigo da família: “Xande, to indo no Pai Maneco, vamos lá?” E eu fui. E cheguei às 8:20, aproximadamente.
Atabaque comendo solto, perto de 100 pessoas cantando para meu Pai Ogum. E a única coisa que consegui fazer naquele momento, após o arrepio na alma, foi chorar.
A gira era de Exú. E eu não tinha consulta, não tinha nada. E o Paulo conseguiu me encaixar, no fim da gira, com seu Tata Caveira, da Mãe Rita.
Sentei, disse o que me incomodava, e o Exú, com sua habitual força de expressão, gritou “Caveirinha, tenho um filho aqui precisando de ajuda. Posso botar no meio?”
Fui, sentei no meio do terreiro, e cantaram para as Almas. O Exú achar o caminho correto de iniciar a resolução do meu problema familiar foi muito importante.
Mas, o fundamental, foi o que a Umbanda deve ser: a prática da caridade sem ver a quem. O ajudar, o braço, o ombro estendido. O fazer sem esperar algo em troca. O simples ajudar.
Naquele dia ganhei ajuda. E a partir daquele dia ganhei amigas e amigos. Sou um frequentador assíduo. O TPM é o que me mantém conectado à Umbanda.
É uma casa que sempre terei no meu coração, pois pratica a Umbanda que aprendi na minha vida. E, para concluir, volto ao primeiro parágrafo, até para comparar.
No Rio, eu estava sem terreiro, e do nada me apareceu uma carona para ir à uma festa de Ogum. Lá fiquei, lá fiz minhas obrigações, e de lá tenho orgulho de ser filho de santo.
E, aqui no Pai Maneco, a essência é a mesma: em um momento de agonia, uma “carona” fez com que a montanha, mais uma vez, passasse no caminho de Maomé.
Meu Saravá de coração a todos os filhos da corrente, a todos amigos que fiz.

Alexandre Souteiro

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