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Umbanda: Quer Entrar?

Um amigo me disse empolgado que queria ser umbandista também. Que achava lindo todo mundo de branco cantando e dançando. E palmas sorrindo felizes ao som dos atabaques. Disse que queria sentir o que era a comunicação com a outra realidade e que iria se esforçar o máximo para ser um médium de incorporação e também receber a energia e o axé de todos os orixás.
Meio sorrindo, meio amargo respondi:
– É lindo vestir branco e estar na gira cantando e dançando, mas a magia tem seu preço. E Lindo também é no dia seguinte a gira o cavalo cansado, as coisas que dão errado, você improdutivo e sua energia se reconstituindo aos poucos. O dia seguinte é de pés na terra, banhos no rio pra quem pode; mãos no artesanato, músicas do seu gosto, filmes, séries ou hobbies e outras coisas que te relaxem e te revigorem – isso pra quem pode, porque muitos de nós na manhã seguinte estamos de volta ao trabalho material e à labuta diária sem tempo para nos recompor. Seguir em frente meio torto e com muita fé – aceitar que foi um sacrifício que a gente escolheu.
Na nossa casa, um dia antes da gira a gente se prepara e se guarda para o trabalho: não gastamos energia, falamos pouco. Sem carne vermelha, sem porco, sem sexo. Sem muito barulho nem muita exaltação. Álcool nem no vinagre… Exageros a parte, preparamos o nosso banho de ervas antes de ir ao trabalho espiritual e muitas complicações e entraves acontecem neste dia. Tudo parece que joga contra até que você pisa na sua casa espiritual, onde estão os guias e protetores e mais um trabalho assistencial por chegar. Então a vida se acalma um pouco e começa o profundo trabalho de concentração e reflexão sobre a responsabilidade do trabalho a ser desempenhado: ali você não é o ego-estrela da sua performance diária e do seu showzinho particular: é um outro tipo de estrela, que brilha pra acalentar os outros. Ali a caridade é o pilar mais profundo e seu coração, seu corpo e pensamentos nada mais são que instrumentos de trabalho. Cruel? Depende do ponto de vista, mas assim é a umbanda – hierarquia, obediência e confiança (tanto no plano terreno quanto no Astral).
Você não vai fazer uma macumba2 para conseguir mais dinheiro, um amor, um emprego novo ou pra fazer mal a alguém. Você pode até pedir, porém se estiver dentro de uma casa séria e com espíritos de luz e da lei, o que te espera é uma bela bronca (se pedir ao caboclo), um puxãozinho de orelha (se pedir aos nego-véio) ou esculacho vergonhoso se pedir pra um Exu num dia já não muito propício. E no final da consulta você vai entender que eles vão te ajudar a tomar seu rumo na vida, ser uma pessoa melhor, entender suas reais necessidades para, desse jeito, você (e ninguém mais) ir atrás dos seus objetivos e concretizá-los da forma correta. Ali na gira você vai entender porque a vaidade, o orgulho e o maldizer são lixos cósmicos e mundanos. Vai viver o quão sério é o resgate dos carmas e que a lei do universo apesar de simples não poderia ser mais complexa: tudo que você lança no ar volta para você. Não importa que seja daqui à uma hora ou 300 anos, vai voltar. Como disse meu pai – Laroye, Exu – “Quem merece recebe, quem deve paga”. Só isso. Quanto aos seus irmãos de corrente e pessoas com quem você vai trabalhar uma palavra é necessário ter em mente: Amor. Muito amor para com todos que estão no trabalho. E quando eu digo amor eu não falo sobre sentimento. Estou falando sobre conduta, respeito e trabalho em equipe. Uma casa em harmonia e com um bom trabalho tem amor de sobra acontecendo, mesmo que os membros da corrente não se gostem. Amor é escolha – um bonito exercício do livre-arbítrio.
-É acho que vou pra casa refletir bem.
-Sim, faça-o.
-E tem mais uma coisa. Além de tudo isso se acostume a engolir alguns sapos, compreender ofensas, entender a ira alheia e resguardar a sua, refletir e também perdoar. A mediunidade é complicada e seu desenvolvimento mais ainda. Ela não te acompanha só no Terreiro, assim como os guias espirituais que te protegem e vêm ao seu auxílio nas horas de dificuldades. Aprenda a não maldizer ninguém e nem plantar coisas ruins – ou deseja-las para outras pessoas. Enquanto a preta ou preto-velho vão te acalmar nestas situações, te envolver num abraço astral inenarrável, e fazer você entender que não é plantando o mal que as coisas funcionam, os Exus podem comprar sua briga. Essas entidades poderosíssimas trabalham na linha de reparação cármica: Exu é amigo e muito parceiro. Ele pode, ocasionalmente, ir cobrar do camarada com o qual houve essa desavença alguns de seus débitos e cargas de atos ruins que este ser humano carrega. Agora pense nesse indivíduo com uma carga cármica negativa gigante na sua existência, e agora na Terra ele está aprendendo e fazendo essa reparação aos poucos. Você, às vezes sem saber, desejando e pedindo que ele pague pelo que fez? No mínimo não é legal, né? Todos tem o direito de reparar seus atos e vão fazer isso no seu devido tempo – nesta vida ou em outras. Não cabe a nós interferir nisso.
– Nem os políticos desonestos, os pedófilos, assassinos e tantas outras ruindades em forma de pessoas?
– Você não é o juiz desse entrave e, talvez, se fosse, não precisaria ter voltado a esta existência na Terra. Cuidemos das nossas reparações que de certo temos algumas tantas para nos preocupar… E agora, explicadas as palmas e sorrisos na gira, se você estiver disposto a se dar sem nada a receber, bem vindo meu irmão, a umbanda é paz, amor e um reino cheio de luz. É força que nos dá vida e à grandeza nos conduz. Axé!

RAFAEL GUIJARRO BUENO

2 thoughts on “Umbanda: Quer Entrar?

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